A violência doméstica no Brasil é um problema alarmante que afeta milhares de mulheres, causando cicatrizes profundas e, muitas vezes, levando a consequências trágicas. Vítimas de abusos físicos e psicológicos frequentemente perdem a autoestima e passam a acreditar que são incapazes de viver uma vida plena longe do companheiro agressor. A escuta qualificada se torna uma ferramenta essencial nesse contexto, oferecendo um apoio imprescindível às vítimas.
No último dia 05 de junho, um caso de violência psicológica extrema foi revelado no interior do Pará. Um homem foi preso após invadir a casa de sua ex-companheira, sob efeito de álcool, exigindo dinheiro. Esse incidente foi o desfecho de uma série de abusos que começaram em Maringá, Paraná, no final de 2023, quando o agressor obrigou a mulher a interromper o tratamento contra um câncer e a levou de volta para Uruará, no sudoeste do Pará.
Isolada em uma pequena propriedade rural e sem acesso a medicamentos, a saúde da vítima se agravou e ela foi induzida a vender todos os seus bens. Uma semana antes da prisão, o homem a levou a uma funerária e a fez comprar um caixão, afirmando que a esposa tinha um câncer terminal. A cena da vítima na funerária chocou os moradores da cidade, que informaram os familiares da vítima e acionaram a polícia.
Segundo o Atlas da Violência 2024, divulgado em 18 de junho, mais de 48 mil mulheres foram assassinadas no Brasil entre 2012 e 2022. Nesse período, 34,5% ocorreram em domicílios, cometidos por companheiros ou ex-companheiros, evidenciando a gravidade e a proximidade da violência. A psicanalista Amanda Souza destaca que a violência doméstica é uma questão de saúde pública que requer atendimento especializado.
“A escuta qualificada é crucial no enfrentamento dessa realidade. É uma abordagem empática e profissional que visa compreender e validar a experiência da vítima, oferecendo um espaço seguro para compartilhar suas vivências sem julgamentos ou interrupções. Isso ajuda a vítima a se sentir acolhida e entendida, devolvendo a esperança de uma solução e a percepção de que ela possui o poder de se libertar desse cárcere mental,” destaca.
Em um ambiente de opressão, muitas mulheres não conseguem se afastar dos agressores, que utilizam diversas táticas para mantê-las sob controle. Quando percebem que estão perdendo domínio, esses homens se tornam violentos e recorrem à força física e a ameaças de morte.
Para muitas vítimas, a violência doméstica é um ciclo que mina sua autoestima e autonomia. De a acordo com a especialista, “Mulheres vítimas desse tipo de violência, muitas vezes são vítmas de violência patrimonial, onde os agressores não às fazem perderem seus empregos, mas se apoderam ou controlam sua renda, as obrigando a fazer pix para eles, se apoderam de seus apçicativos de bancos, de seus cartões, e quando a vítima se dá conta, ela vive para trabalhar e sustentar os abusos financeiros desses homens, não restando nada de sua renda para seu autocuidado, onde elas mais sofrem perdendo autonomia e autoestima. Por isso, a mulher vítima precisa de uma escuta humanizada e de qualidade, para devolver a ela esperança, gerando nela força para sair desse relacionamento altamente destrutivo”, ressalta.
A escuta qualificada permite que profissionais identifiquem sinais de perigo iminente. Em muitos casos, as vítimas podem não perceber a gravidade da situação ou ter normalizado a violência devido ao abuso contínuo. “Um ouvinte qualificado pode detectar sinais sutis de escalada da violência e intervir antes que a situação se torne fatal,” alerta Amanda. Ela ressalta que a normalização da violência pode estar relacionada a um histórico familiar de abuso ou a relações disfuncionais na infância, que fazem com que as vítimas encarem a violência como algo natural.
Além de oferecer um espaço seguro para a vítima se expressar, a escuta qualificada é essencial para fornecer orientações e encaminhamentos adequados. Profissionais treinados podem oferecer informações sobre recursos legais, abrigos e apoio psicológico, ajudando a vítima a tomar decisões informadas. “O profissional deve transmitir segurança à vítima, mostrando que ela está segura e pode confiar tanto nele quanto nas autoridades competentes,” enfatiza Amanda.
A busca por ajuda frequentemente leva a vítima a reviver o trauma ao relatar suas experiências repetidamente. Amanda reforça que “a escuta qualificada, sendo uma abordagem centrada e respeitosa, minimiza essa revitimização, assegurando que a vítima não precise contar sua história diversas vezes. Reviver o trauma pode piorar o estado emocional da vítima, por isso, a humanização no acolhimento é essencial.”
A escuta qualificada também permite que profissionais eduquem a vítima sobre os ciclos de abuso e as dinâmicas de poder na violência doméstica. “Compreender essas dinâmicas é crucial para que a vítima possa reconhecer os padrões de abuso e, eventualmente, escapar dessa situação. Para que a escuta qualificada seja eficaz, a vítima precisa se sentir acolhida, compreendida e segura,” esclarece Amanda.
Com uma experiência de oito anos em escuta qualificada, Amanda Souza afirma que essa prática não é apenas uma técnica, mas uma ferramenta de transformação social. “Ela capacita as vítimas, protege suas vidas e contribui para uma sociedade mais justa e segura. Em um cenário onde mais de 48 mil mulheres foram assassinadas em uma década, investir em práticas que promovam a escuta ativa e empática é urgente e indispensável para mudar esse cenário de tragédia.”
Hoje, a mulher resgatada após ser obrigada a comprar um caixão pelo marido está sob os cuidados de familiares, retomou o tratamento de saúde e recebe acompanhamento psicológico. O ex-marido foi denunciado por violência doméstica com base na Lei Maria da Penha, e segue preso.
Sobre Amanda Souza, Psicanalista
Amanda Souza é psicanalista com oito anos de experiência em escuta qualificada, atendendo tanto presencialmente quanto online em seu consultório no Rio de Janeiro. Em suas redes sociais, no perfil “serhumanoemfoco”, ela publica orientações relevantes para a população, ajudando a transformar vidas com seu conhecimento e experiência.
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KARINA DA SILVA SOUZA PINTO
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